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OEA recebe denúncia do movimento negro sobre violência policial no Brasil

Por Nataly Simões e Pedro Borges

Governadores João Dória e Wilson Witzel são alvos da denúncia do movimento negro; caso de Paraisópolis também será colocado em pauta pelos ativistas em encontro no Haiti, em março

A Coalizão Negra por Direitos, grupo com mais de 60 organizações antirracistas, denunciou a nível internacional a violência cometida pela polícia no país, em especial nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. O órgão a receber a queixa foi a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), instituição vinculada à Organização dos Estados Americanos (OEA).

Depois de enviar a denúncia, a Coalizão Negra por Direitos participa de audiência sobre o tema no dia 6 de março, das 11h30 às 12h30, na cidade de Porto Príncipe, Haiti. A sessão é uma discussão bilateral, que conta com a presença do movimento negro, da CIDH e de representantes do estado brasileiro.

Para a coordenadora da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP, Sheila Carvalho, a denúncia sobre as políticas de segurança pública implementadas por governantes como João Dória (PSDB-SP) e Wilson Witzel (PSC-RJ) são importantes porque corroboram com o que o movimento negro chama de genocídio.

“Os atuais governantes têm impacto direto em como o processo de genocídio acontece no Brasil. São os governadores dos estados que estabelecem como as polícias devem agir e quais são os protocolos de atuação. As ações determinadas por estes não só manifestam uma lógica de guerra, como as narrativas públicas desses governantes legitimam toda e qualquer atitude violenta da polícia”, explica.

Sheila Carvalho destaca que não é somente o movimento negro que aponta a existência de um genocídio em curso no país. “Em 2016, o Senado Federal reconheceu que a cada 23 minutos ocorre a morte de um jovem negro no Brasil e que ‘este processo está umbilicalmente marcado pelo racismo institucional’, em suas palavras exatas. Em um grande e exaustivo trabalho, a CPI do Senado após ouvir diversas perspectivas e pesquisas sobre a situação dos negros no Brasil concluiu que ‘o Estado brasileiro, direta ou indiretamente, provoca o genocídio da população jovem e negra’.”, recorda.

Encontro no Haiti

O encontro da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH) com representantes do estado brasileiro e do movimento negro acontece entre os dias 2 e 8 de março, no país haitiano. O objetivo é debater temas relacionados ao Brasil e a outras nações do continente americano.

Além da violência policial em São Paulo e no Rio de Janeiro, o movimento negro levará a discussão especificamente sobre o caso de Paraisópolis, quando em novembro 9 jovens foram assassinados durante um baile funk que ocorre na região, na Zona Sul da cidade paulistana.

De acordo com os moradores, a Polícia Militar fez um cerco na região e encurralou os jovens em becos, que resultaram nas mortes. A versão da PM diz que a corporação, após ser recebida com o arremesso de objetos, revidou com bombas de gás lacrimogêneo para dispersão, o que resultou no tumulto e consequentemente nas mortes.

Os 31 policiais envolvidos no caso foram isentos da punição pela Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo, que pediu o arquivamento do caso. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condenou a decisão e pediu uma investigação “séria, imparcial e eficaz dos fatos”.

O governo de Jair Bolsonaro também deve responder à CIDH sobre restrições de liberdade de imprensa e a situação dos direitos humanos no país. Segundo a coordenadora da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP, Sheila Carvalho, o presidente também é responsável pelo aumento da violência policial nos estados.

“Bolsonaro é responsável por apoiar em suas falas públicas o incentivo à forma precípua de atuação policial. Como o próprio presidente já afirmou ‘se alguém disser que quero dar carta branca para policial militar matar, eu respondo: quero sim!” e que ‘os caras tem que morrer igual barata’. As baratas para Bolsonaro somos nós. Pessoas negras, consideradas por esse tipo de governante seres que não merecem viver. Isso precisa ser denunciado em todos os espaços possíveis, nacionais e internacionais”, avalia.

Agenda de denúncias do movimento negro

Essa não é a primeira denúncia feita pelo movimento negro à CIDH. Em 2019, a mesma Coalizão Negra por Direitos denunciou ao órgão, em Kingston, na Jamaica, o projeto de segurança pública do ministro da Justiça, Sérgio Moro, conhecido como “pacote anti crime”. O projeto de Jair Bolsonaro em defesa da liberação da posse e do porte de armas de fogo também foi denunciado pela Coalizão no ano passado.

Sheila Carvalho defende que a agenda de denúncias a nível internacional da Coalizão Negra por Direitos marca um novo tempo na atuação do movimento negro articulado em rede com coletivos e organizações presentes em todo o país.

“A Coalizão traz de fato vozes negras para serem ouvidas nos mecanismos internacionais. A agenda internacional dialoga com a incidência política realizada no país. Assim, essa atuação internacional se faz essencial para que possamos ter mais êxito nas batalhas travadas por aqui. É levar o debate do genocídio negro para uma agenda global, evidenciar que é fundamental uma ação de múltiplos setores e mecanismos – nacionais e internacionais – para enfrentar a necropolítica existente destinada aos corpos negros”, complementa.

A Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH) é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA). O objetivo é promover a observância e defesa dos direitos humanos no continente americano o e atuar como órgão consultivo da OEA na temática. A Comissão é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

Reportagem publicada originalmente no Alma Preta.

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